terça-feira, 4 de setembro de 2012

O drible

           Não é agricultura ou esporte. É vida. Saber evitar as ferramentas de guerra. Usar a cabeça e o corpo. E os corpos em sintonia. Como uma dança. Inspirado nas batalhas, nos jogos, na relação com formigas, pulgões, mosquitos, cachorro e com o galo do vizinho. E com o vizinho. A arquibancada treme quando um belo tomate vai amadurecendo saudável.
        Toque certo no momento certo. A bola segue perfeitamente o caminho que o mestre lhe desejou. Com seu corpo, engana o adversário, espanta os maus espíritos, deixa o zagueiro de bunda no chão e contagia as multidões com a arte da dança, do esperar, fingir, inovar, tocar com carinho e precisão magistrais. O drible encanta o coração e dá vida aos seres vivos envolvidos. Ao time adversário, a energia para se recompor e encarar mais uma vez o artista, agora com maior cuidado, mas é aí que leva mais um daqueles desconcertantes, rápido, que encerra a disputa e consagra o controle do sétimo sentido ao ser humano com mais intimidade. Aquele que tem paixão pelo que faz e domínio inconsciente faz parte do quintal do futebol. Não é a borboleta ou o caracol. Mais. Muito mais. Tem o domínio do ataque das pragas. Sabe quando ele vai acontecer. Tem o movimento preciso para o impreciso. Escuta o futuro pela umidade do ar. Sabe a posição de cada ser vivo, seu estado de espírito, como ele acordou de manhã e o que ele pretende fazer para o café. Para ele não é um jogo, é a vida. Não é apenas um campo, um gramado, um quintal de seres diversos, com aparências, idades e estilos de podas capilares. Sangue borbulhando com pressão na hora do movimento, vento a 16 nós, gosto de ar com manjericão nas papilas gustativas, movimentos e posicionamentos perfeitos, um após o outro. Um milagre da natureza. Praticamente o mestre dos magos abrindo o portal para o parque de diversões.